O Menor São João do Mundo

Créditos: Moema França

Por Moema França

É curioso viver com coisas menores e em pouca quantidade que uma pandemia exige na cidade que se auto intitula o maior São João do Mundo. Veja bem, aqui em Caruaru tem 42 comidas gigantes que incluem o ícone Maior Cuscuz do Mundo e os ilustres Maiores Xerém com Galinha, Canjica, Tareco e Mariola, Milho Gigante, Bolo de Saia, Tapioca, Quentão e Chocolate Quente do Mundo.

Um lugar que tem uma Associação das Comidas Gigantes e que sancionou uma lei municipal pro Dia Municipal das Comidas Gigantes. A lista é grande, mas o São João desse ano pequenininho.

Como se reduz uma festa que dura muitos anos, que envolve roupas, comidas, música, dança, decoração, até temperatura e clima específicos? Qual seria a célula que faz o São João ser tudo isso e não outra coisa? Apelei pros símbolos e lembrei de Byron, da Confraria da Sucata, que fez a menor fogueira do mundo em algum uma vez.

Pois aqui em casa juntei uns fósforos e fiz A Menor e Mais Particular Fogueira do Mundo, abri uma mini-cervejinha e dei uma choradinha de leve. De cara feia na sala, de longe escuto painho já rindo de mim, com camisa xadrez, tocando pela 4281 vez Asa Branca na sanfona, sem zabumba e sem triângulo.

Deu aquela fisgadinha boba no coração de quem cai a ficha. Ir pro pátio é massa, mas bom mesmo é ver toda a família junta comendo, bebendo, dançando, cantando Luiz Gonzaga e mais tantos, roubando o microfone do trio pé-de-serra. Essa coisa de acender fogueira, brincar com fogo, mexer com pólvora, ver coisa explodindo no ar é a mágica mais bonita que já vi.

As festas de palhoças, décadas atrás, talvez tivessem um sentimento amplificado: reunia famílias na mesma rua, por várias ruas, como uma costura que borda a cidade toda com um mesma linha. São João me dá vontade de celebrar essa conexão que a gente tem com quem existiu antes que eu chegasse aqui. É o momento que sinto que mais pertenço ao mundo, mais até do que no Carnaval. Parece que o Nordeste inteiro deu uma rasteira no sofrimento por meio de um xambrego, uma umbigada certeira.

A música que escuto hoje é “São João sem Futrica”, de João Silva e Zé Mocó, cuja letra diz: “Nunca vi São João / Sem foguete, sem fogueira / Tric-trac, ronqueira / Busca pé e balão / Sem adivinhação / Milho assado e canjica / Sem sanfoneiro, é futrica / Pra mim nunca foi São João”.

2020 teve quase nada disso e não tenho a sensação de que o São João é só saudade ou muito menos morreu. Porque se tem uma coisa que a gente vai salvar desse incêndio é o próprio fogo pra fazer muita comida gigante ainda.

Fica aí o manifesto.

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